terça-feira, 25 de novembro de 2008

Da Diáspora: Identidades e Mediações Culturais (Stuart Hall)


Nasce a diáspora afro-caribenha em 1948, no pós-guerra, com o navio-transporte SS Empire Windrusch que conduzia imigrantes do Caribe para a Grã-Bretanha. A questão da diáspora em sua complexidade se refere a construção e ao imaginário da nação e da identidade. Um sujeito imaginado está em jogo, bem como diásporas e identidades múltiplas. O assentamento dos negros na Grã-Bretanha não se desligou de suas raízes no Caribe. Assim uma minoria étnica emerge através da identificação com os locais de assentamento, com re-identificações simbólicas com culturas africanas e afro-americanas. Essencialmente presume-se a experiência diaspórica e a identidade cultural, que é tanto fixada no nascimento e parte da natureza quanto é impressa pelo parentesco e constitutiva do nosso interior.

O conceito de diáspora é bem conhecido, provém da história dos judeus que foram levados à escravidão no Egito, Moisés e seu grande êxodo e pela significação do holocausto nazista. Os mitos fundadores são, por isso, aistóricos, afinal uma tribo imutável e atemporal é capaz de ligar o passado, o futuro e o presente numa linha ininterrupta (a tradição de um mito). De um lado, da diáspora judia (retorno a Israel) há o conflito com os países do Oriente Médio (os palestinos, em especial). De outro, a África se refere a uma variedade de povos, tribos, culturas e línguas, mas possuem um ponto em comum – o tráfico de escravos. Os híbridos caribenhos passam por uma lógica cultural ‘transcultural’ e da ‘crioulização’, são grupos marginais selecionados que criam a partir do material oferecido pela metrópole. Observa-se uma zona de contato, de co-presença espaço-temporal de sujeitos (antes isolados) que agora se cruzam. A diáspora em uma concepção binária de diferença (passagem, deslize), fronteira de exclusão, construção de um outro em oposição rígida. De Salman Rushdie e do hibridismo destaca-se uma formação sincrética em que os elementos formam desigualdades (inscrições diferentes nas relações de poder), onde a luta cultural está em relação de dependência e subordinação às histórias imperiais.

Será que o Estado-nação constitui uma estrutura útil para compreender as trocas culturais entre as diásporas negras? A globalização e a tensão entre a heterogeneidade do mercado global e as forças centrípetas do Estado constituem as primeiras fases da história global: o apogeu do imperialismo no século XIX, as duas guerras mundiais e a independência/descolonização terminam esta fase. Trata-se da resistência das culturas a serem encurraladas nas fronteiras nacionais. Com a globalização pós-1970 houve o enraizamento nas disparidades de poder e riqueza. O descentramento cultural e os Estados-nação foram subordinados a operações globais mais amplas. Nessa perspectiva diaspórica da cultura restou a subversão ao modelo orientado para as nações. Como articular a proposição novamente em que a ‘África vive’ na narrativa caribenha?

A supressão da África não foi irresistível. A raça permanece como o segredo culposo, o código oculto, o trauma indizível, mas a África torna pronunciável a raça como condição social e cultural da existência dos caribenhos. As identidades formadas no interior da matriz dos significados coloniais são construídas para barrar e rejeitar o engajamento com as histórias reais de nossa sociedade ou de suas ‘rotas culturais’. Assim, o rastafari surge para descolonizar a mente dos migrantes caribenhos.

A cultura é uma produção de conhecimento da tradição como o ‘mesmo em mutação’ e um conjunto de genealogias. Fazer-nos capacitar a nos produzir a nós mesmos de novo através da cultura, como novos tipos de sujeitos. A cultura como uma questão de se tornar. Os processos de migrações livres e forçadas estão diversificando as culturas e pluralizando as identidades. Fluxos não regulares de povos são praticamente fluxos de capital e tecnologia. Fluxos de povos que inauguram um novo processo de minorização em antigas sociedades metropolitanas. Há dois processos opostos nas formas contemporâneas de globalização: as forças dominantes de homogeneização cultural (cultura americana) e os processos sutis de descentramento dos modelos ocidentais (disseminação da diferença cultural). O local e o global atados um ao outro como condição entre si, mas a diáspora é a trajetória de um povo e de uma cultura modernos.

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